Estou há muito tempo para lhe escrever. Na verdade, diversas vezes mentalizei tudo que escreveria a ti, mas na hora que parava para fazê-lo, as ideias se embaralhavam e nada conseguia sair.
Hoje apenas parei e comecei a escrever, sem tentar me lembrar do que imaginava escrever. Simplesmente parei o que estava fazendo e vim dar vida a essas linhas sem imaginar por onde começar ou como terminar. Deixar fluir, como sempre deveria fazer.
Estive remexendo em velhas pastas de arquivos e encontrei muita coisa que acreditava estar perdida. Fiquei feliz em encontrar, fiquei feliz em relembrar histórias antigas, coisas pelo que passei, muitas que havia trancado em algum lugar de minha mente e de meu coração. Me senti transportado de novo para aqueles momentos, vivendo as alegrias e tristezas de outrora, sorrindo e segurando o choro, este nem sempre tão intenso por saber hoje que o desfecho não fora tão trágico quanto o pensado na ocasião.
Incrível a capacidade de selecionarmos as lembranças e guardar bem lá no fundo algumas sejam elas boas ou ruins. E então ficamos com o que sentimos muitas vezes consolidado em cima de lembranças guardadas e basta um clique para que lembremos de tudo, cada capítulo, cada emoção, as conquistas e derrotas de cada dia. Tudo aquilo que nos formou e moldou para sermos o que somos hoje.
Valeu a pena? "Tudo vale a pena quando a alma não é pequena (...)". Fernando Pessoa escreveu esses versos com muita propriedade, ressaltando que quem quer passar para o caminho das alegrias, das conquistas , tem que passar também pela dor e dificuldades.
E no fim, acho que passei por tudo isso. Mudaria alguma coisa? É bem sábio e poético dizer que se passasse por todos os momentos faria tudo igual porque aprendeu muito e blá blá blá. Mas a verdade não é essa, nem poderia ser. Com a sabedoria de hoje não conseguiria dar os mesmos passos que dei antes, nem os certos nem os errados. Possivelmente acertaria em muitos pontos onde errei, e cometeria novos erros, outros acertos e muita coisa seria distinta.
E assim seria um grande paradoxo se pensarmos em destino. Se determinado acontecimento fosse "predestinado" por mais diferente que agíssemos, no fim convergiria para ele, sem mudanças drásticas. Se destino a gente que constrói, acabaríamos construindo um novo, diferente e não necessariamente mais feliz ou mais triste, apenas diferente.
Mas o que nos daria a segurança de interagir (se possível fosse) com nosso próprio passado sem medo? O mesmo que me inspirou a começar a escrever hoje: as lembranças. E também a ausência delas, pois o que nos impediria de interagir plenamente seria a simples comparação com o caminho seguido antes. Então, se tivéssemos a sabedoria e a maturidade, sem todas as lembranças de cada consequência a curto, médio e longo prazo, nos entregaríamos plenamente a essa utopia de reviver o passado, não para corrigi-lo e sim para vivermos com a intensidade não vivida por falta de sabedoria.
Assim seria possível seguir conforme a canção: "(...)E vivermos o futuro não o passado (...)". Viver o passado é triste, remoer tristezas, arrependimentos, saudades. O melhor é usar o passado como sabedoria para novos capítulos, com velhos e novos personagens, nessa grande história que é nossa vida, um filme sem roteiro definido, sem contra-regra para nos lembrar das falas, sem ensaio. Um filme gravado no dia a dia e ao vivo, sem chance de reencenar as falhas. Quem sabe um dia não possam inventar uma máquina que permita o "remake" dos "melhores momentos"? Seria bom, mas até lá vamos viver cada dia com a intensidade que pudermos, sem medo de ser feliz, sem deixar para outro dia a palavra que deve ser dita, deixar para outro dia o que deve ser feito. Por quê? Porque hoje pode ser o grande dia, o dia "Gran Final" de nossa história, e pode ser que um dia a ciência possibilite voltar no tempo, mas voltar dos mortos... Só no apocalipse zumbi!
Findo aqui está carta e esse texto com a forma como muitos acreditam que terminará o mundo. Para mim não, para mim o fim será o dia em que não mais puder escrever para ti e você não puder mais ler o que escrevo. Nesse dia terei certeza que meu coração parou de bater, por não ser mais necessário.
Porque o que era, continua sendo e sempre será. Coma graça de Deus.
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