Eu não tinha nada além de mim mesmo. Preso em um mundo onde nada fazia sentido.
Fui uma criança feliz. Não sei dizer até quando o peso morto da vida não existia sob meus ombros, mas foi bem mais cedo do que normalmente acontece com as pessoas. Isso quando acontece.
Bem cedo comecei a ver que o mundo não me agradava, me incomodava. Criei um mundo para mim e personagens para viver o que eu não queria. Fui vários personagens: estudante, irmão, filho, primo, sobrinho, amigo, colega. Vários personagens que me permitiam não "me expor" e me sentir mais seguro. Mas isso não me fazia mais feliz, me poupava tanto de dores quanto de alegrias externas. Internamente só me afogava em mim mesmo.
Novos mundos surgem, aproximando os que estão longe, afastando quem está perto. Para mim era apenas mais uma oportunidade de tentar ser agora o mais importante dos personagens: eu mesmo. Mas ali era ainda mais fácil ser outro, ser outros, ser muitos ao mesmo tempo. E meu mundo, meu infinito particular, já era um lugar tão aconchegante que eu já não quereria sair de lá. E ao invés de abrir uma porta, aproveitei o ambiente propício para levantar muros cada vez mais altos e fortes.
Dentro dos muros eu adoecia sem perceber. Minha mente já começava a se deteriorar, enquanto meu corpo era pouco a pouco envenenado. Entorpecido por esse veneno fui tentando continuar. Assim como ainda continuo.
Hoje, mesmo querendo voltar a ser eu mesmo, não o posso, não totalmente. Por tanto tempo tentei ser tantos outros que hoje já não sei quem eu sou. Me sinto uma mistura disforme de todos os personagens que criei, ao mesmo tempo não sou nenhum deles, nem eu mesmo. Corpo e mente envenenados por tudo que não vivi como eu mesmo, por tudo que ficou guardado e foi apodrecendo por dentro, contaminando. Hoje estou apenas sobrevivendo...
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