Amanheci com uma sensação estranha.
Um vazio estranho dominava todo meu ser. Mente vazia, e uma sensação de absoluta ausência de tudo, inclusive de mim mesmo. Olhei para os lados e nada. Nada mesmo.
O quarto estava vazio, nem mesmo a cama da qual eu acabara de levantar estava ali. Em poucos passos percebi que toda casa estava vazia, nada nem ninguém. E eu estava tranquilo. Conforme eu andava, percebia que as próprias paredes perdiam sua materialidade. Em pouco tempo tudo a meu redor não passava de um imenso espaço vazio, como uma enorme sala de paredes, teto e piso brancos.
Sentei e deixei-me imergir naquela sensação que me acompanhava desde o despertar. Gradualmente comecei a me lembrar de vários momentos de minha vida, várias pessoas que conheci. Lembrei-me de você que está lendo, que eu posso conhecer, posso já ter visto, conversado ou não. Talvez todo contato que tenhamos tido tenha sido realmente por aqui: eu escrevendo, você lendo, comentando ou não.
E as lembranças se misturaram entre si, se misturaram com planos nunca realizados, com situações que nunca saíram do pensamento, projetos nunca saídos do papel. Em todo aquele espaço branco pintou-se uma tela de histórias, lembranças, planos, sonhos, todos misturados de uma forma que não consegui mais discernir o que era real ou imaginação.
Agora eu estava ali inerte, sem sentir meu próprio corpo como se eu fosse apenas toda aquela miscelânea de informações que ali estava passando naquela estranha tela branca. Por um momento acreditei que eu havia morrido. Sim, morri e toda minha vida estava passando diante dos meus olhos. Minha vida, meus sonhos, meus planos, as pessoas que conheci, as pessoas que deixei de conhecer, os caminhos que segui e aqueles que abandonei sem percorrer.
De repente ouço um barulho que me tira de todo aquele transe. Era como se algo arranhasse e rasgasse uma parte daquele espaço. Sim, era um arranhado, e eu conhecia aquele ritmo. Contudo, estava imóvel, não podia mover nem mesmo a cabeça para olhar. Pelo rasgo ele entrou, e atrás de si, o mesmo rasgo se fechou. Após observar-me, deitou-se a meu lado. E exatamente após ter deitado, cores invadiram as paredes, teto e chão. Cores aleatórias e disformes.
Custei a entender o que acontecia. Deitou a minha espera. Veio me buscar. Olhei bem para o alto e vi como um grande buraco de minhoca, e do outro lado ele lá, deitado em seu lugar habitual, dormindo. Entendi tudo. Deixou seu corpo descansando e veio me acompanhar.
Não me restava mais nada. Pela primeira vez desde que "acordara", fechei meus olhos e me deixei levar. Estava agora leve, não me mexia, não andava, mas meu corpo antes tenso estava relaxado e parecia levitar. Sem saber para onde estava indo deixei-me levar, e quando finalmente senti que parara, abri os olhos e já não sabia se voltara ou se estava em outro lugar.
Mas no alto ele dormia, como se nada houvesse acontecido. Se algo acontecera realmente.
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