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terça-feira, 14 de maio de 2013

Anjo

Caminhava entre os montes. Era um caminho aparentemente seguro, não subiria os montes, ficaria a sombra deles. Não me queimaria ao sol, nem tropeçaria em suas pedras. Para qualquer um parecia uma fuga do caminho mais belo dos verdes montes e do sol. Para mim era comodo e fácil.

De repente ouvi uma voz que parecia vir do monte a minha frente. Não, não enxergava quem falara, mas ouvia. Para ouvir comecei a subir o monte, longe daquela trilha que eu achava ser tão segura. Não sei explicar como, mas sabia ser um anjo, um enviado divino. Por vezes achei ser fruto da minha imaginação, ou de alguma crença inexistente em meu ser, mas sentia que era içado por esse ser alado. Sentia que através de suas palavras que o caminho desconhecido era agradável, mas mesmo assim tinha medo.

Por que sentiria medo? A mudança, sair do que parecia ser seguro e confiável. Nunca havia encarado o sol de frente, nunca vira as pastagens por cima dos montes. Mas não parava de ouvir suas palavras, cada vez mais vezes, parecendo cada vez mais perto, tão perto que poderia tocar, tão perto que poderia ver... Mas não via. Parecia que Deus não dera a esse anjo poderes de atravessar o tecido do universo, de romper as barreiras que o colocaria frente a frente comigo. Nem eu fui capaz de romper tais barreiras. Só queria continuar ali seguindo, sempre olhando para o vale que deixara abaixo.

O tempo passava, e eu já buscava caminhar por aquele terreno que apesar de mais sinuoso me era mais agradável. Agradável mas diferente e temia sempre perder o contato com aquela luz que estava me guiando e incentivando. Meu medo certas vezes me afastava daquele caminho. Em outras ocasiões palavras não expressavam pensamentos e a noite parecia chegar mais cedo.

Com o tempo, não ouvia mais o anjo guia. Suas palavras estavam dentro de mim, mas não sabia seu paradeiro. Por diversas vezes temi que Deus o chamara de volta. Por diversas vezes imaginei tão somente que encontrara outro a ser guiado por suas palavras a subir os montes, a ver as belezas da vida. Tantos pensamentos confusos, e difusos. Me conformara com a nova realidade a minha frente, pelo menos assim achava. Já não ouvia vozes, para todos isso parecia mais normal, para mim não. Nesse caminho encontrara andarilhos, sempre querendo que todos fossem como o anjo que me conduzira até ali. Por mais que tentasse, sempre que tentara alçar voo, eu caía, e parecia que cada tombo era mais dolorido que o anterior.

Não, não voltaria atrás. Não me lembrava mais como era, nem como chegar naquela trilha entre os montes. Deveria percorre-los, subir e descê-los, mesmo que sem guia. O corpo doía, mas a vontade de seguir em frente era muito maior. Encontrei outra pessoa que subia com dificuldades e nos aparamos por alguns metros. Parecia um caminho sem fim, mas eu não queria desistir. Sabia que existiam curvas que tornariam a subida mais fácil, sabia que me aliar seria a forma mais agradável de conseguir exito. Apesar da bela paisagem, sabia que as alianças ali não diferenciavam da guerra: qualquer aliança errada e rolaria morro a baixo como acontecera antes. Antes de arriscar uma nova aliança, quereria saber onde andava o alado. Se era fato que sumira me deixando no meio do caminho, também era fato que só ele me fizera subir até então. Não o via, não o escutava, não descobri por onde andara. Me convenci que ele seguira seu caminho, talvez fizera alianças e estivesse bem mais a frente. Ficaria feliz se um dia ele soubesse que também segui meu caminho.

Alianças feitas, e ali estava eu descansando, quando encontro um pergaminho do andarilho alado. Ao contrário do que imaginara ele caminhara só ainda.  Estava arrependido pelo caminho tomado e pelo não tomado também. Se pudesse faria algo para que ele se sentisse melhor, mas há muito não está mais na minha alçada isso.

Escrevi uma carta e deixei em um ponto conhecido. Um dia talvez a leia. Ficará feliz de ver que segui em frente. Continuo seguindo meu rumo nos altos e baixos desse caminho sinuoso. Tenho uma inseparável companhia que me ajuda a fincar o cajado nas subidas e não cair nas descidas. Tenho poucas mas fortes alianças, dentro as quais incluo meu amigo alado. Ainda o verei feliz como merece.

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