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quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Crônicas de Mago - Capítulo 4

- O senhor está bem? Não ia nos contar suas histórias?

Só depois que uma criança chama sua atenção, Mago se dá conta que não contara nenhum história até então, apenas ficara em devaneios em sua mente, recordando alguns fatos e personagens.

- Você está certo - afirmou Mago - Até agora não contei nada do que prometi. Mas contarei e começarei com algo bem peculiar que talvez nem saiba explicar. Quem sabe vocês não me ajudam?

Animadas as crianças voltam a sentar-se em volta daquele senhor de aparência centenária, que até então parecia estar em transe.

- Ser chamado de Mago ainda me é estranho. Poucas vezes fui realmente chamado assim, apesar de tal alcunha ser bem antiga. A primeira vez que fui chamado assim foi durante minhas andanças no árido deserto, logo após meu período  de crescimento e meditação. Conheci um andarilho chamado Frei, que me deu essa alcunha.

Nunca fiz magia, mas minhas atitudes sempre pareceram magia até para mim. Paciência, mesmo diante de situações intoleráveis; silêncio em meio ao barulho com único intuito de não aumentá-lo. Mas isso não era magia, nem qualidade, era um sério defeito que me levou a adoecer de tanto acumular dentro de mim.

Com o tempo, mesmo sem agir com magia, todos passaram a se referir a mim como Mago, muitas histórias contadas de minhas andanças e fico feliz em contar um pouco dessas histórias para vocês, enquanto a chama da vida ainda crepita em mim.

Continua

quarta-feira, 15 de agosto de 2018

Incompletos - parte 4

Hoje já não vejo, não ouço, não leio não sei.

Talvez desde que o domo quebrou, nunca se passou tanto tempo assim: silêncio, vazio, ausência.

Não que seja muito diferente de outras ocasiões, porém dessa vez  não há o esvaziamento constante. No entanto não cabe a tristeza dos dias "perdidos", tampouco a exaltação das conquistas derivativas. Cabe primeiro a gratidão.

Gratidão completa pela vida, desde o seu princípio até os dias que nem vieram ainda. Gratidão pelo presente, passado e futuro. Pelo tombos tomados, as cicatrizes que ficaram, as lágrimas derramadas, as dores sentidas, as perdas tão dolorosas. Gratidão por tudo que não entendemos, pois é fácil ser grato pelos momentos agradáveis da vida, é fácil lembrar de agradecer as vitórias, exaltar as maravilhas de Deus quando tudo está bom, de acordo, agradável.

É. É fácil, assim como também o é maldizer e questionar quando as dores vem, quando tudo começa a dar errado. Quando a tristeza quer nos fazer esquecer as bênçãos.

Sou um abençoado, por diversos motivos e ao mesmo tempo sou culpado por diversas vezes esquecer-me disso. Mas sou humano e isso acaba sendo meu ponto fraco.

Por muito tempo não queria ser e me comportava como se não fosse. Era mais fácil parecer insensível inerte e intocável a tudo e a todos. Com isso acumulei muita coisa dentro de mim, e hoje sinto as consequências, que são bem pesadas e dolorosas. De certa forma também não maldigo o tempo de introspecção. Era até agradável estar só mesmo quando acompanhado, ou caminhar a esmo sem rumo durante algumas horas. Porém em outros momentos, guardar era muito ruim, e adoecedor.

Hoje ouço o silêncio e acho ele acolhedor, pois não é o silêncio da ignorância e sim o da paz.

quarta-feira, 8 de agosto de 2018

Crônicas de Mago - Capítulo 3

Tudo que ocorrera até então fora uma mera introdução para a verdadeira história que começaria a partir dali. Todos os personagens e situações que vivera até esse momento não passaram de uma mera preparação para tudo que estava por vir.

Mago iniciou seu caminho de andarilho, passou por povoados e pouco a pouco foi agregando conhecimento, experiências e sabedoria. Em cada povoado conhecida pessoas diferentes que de certa forma mudariam sua história e sua forma de ver o mundo. Muitas histórias já contadas, outras ainda fazem parte de sue acervo pessoal.

Alegrias e decepções. Um aprendizado de como ser e não ser, de como acreditar, desacreditando, confiar desconfiando. Esse foi o desfecho das interações com Usurpador, história já contada. Triste, mas útil a sua vida, a tudo que viveria depois. No mesmo povoado que conhecera Usurpador, tivera contato com outras pessoas que ao longo do tempo viriam a se tornar peças importantes de crescimento para Mago. Talvez dentre tantas pessoas, duas praticamente "opostas" retratem bem o leque de aprendizados naquele povoado.

Rosa e Fogo

Rosa e Fogo eram semelhantes e ao mesmo tempo opostas.

Mago não conheceu Rosa, não de uma vez só. Aos poucos foram dividindo espaços de aprendizado e se aliaram para juntos conquistarem algumas batalhas. E criaram um elo que foi além daquele povoado e até hoje, mesmo se passado anos, ambos sabem o aprendizado adquirido e que se algum dia um precisar, o outro estará ali para ajudar. Ou mandar tudo pro espaço mesmo.

Rosa fazia Mago lembrar de uma pessoa que conhecera em outro povoado, com quem se dera tão bem que manteve contato até sua idade avançada. Parente era uma pessoa que poderia ficar anos sem sequer se falar, mas na primeira conversa a sensação era de que o tempo não fizera nenhuma diferença. E poucas foram as pessoas na vida de Mago que provocaram tal reação.

Já Fogo foi inicialmente discriminado por um grupo. Seu comportamento e bom desempenho nos testes de campo geravam dúvidas sobre os métodos utilizados para suas conquistas. Mago desconhecia os métodos, mas permitiu-se aproximar para entender o que ali se passava. Mal entendimentos a parte, formou-se ali uma aliança pelo fim daquela batalha, e o aprendizado que aparências enganam muito.

Continua

quarta-feira, 1 de agosto de 2018

Incompletos - parte 3

Nunca mais escrevi uma só linha. Poderia escrever, poderia contar velhas histórias, contar projetos concretizados, planos que não saíram do papel ou da imaginação. Mas seria pouco, seria superficial.

Poderia escrever na profundidade dos poetas, ressaltando sentimentos e pensamentos, mas mesmo assim não iria tão fundo nem preciso quanto eu gostaria. Quero ir mais além, escrever mais profundo ainda.

Quero falar do tempo. Não o tempo dos dias, do calendário ou relógio. O tempo do ser, do âmago da pessoa. Meus dias já estão contados, e por mais que eu saiba que isso já era uma verdade no dia em que fui gerado, hoje e a cada dia tudo isso parece mais evidente e real. Meu corpo já não responde ao que minha mente quer, e essa já funciona de uma maneira tão contínua que um desequilíbrio parece ser questão de... tempo.

Minha energia interna está em baixa e oscilante, como se cada dia fosse um pouquinho sugada, e nunca reposta de maneira adequada. Me sinto cansado, mas o cansaço vai além do físico, além de noites mal dormidas. É apenas uma constante e irritante falta de vontade de seguir.

Olho cada vez mais para dentro e tento identificar o ponto em que começou, seja físico ou temporal. Onde está o ponto de dreno, quando começou isso. Não sei. Tudo que sei é que o fluxo continua, de entrada e saída de energia, e se por algum motivo a entrada diminui, minhas forças vão para baixo e quase não consigo me mexer.

E toda minha vontade se resume a continuar entrando até o fundo de mim, onde ninguém jamais esteve. Nem mesmo eu mesmo...